Em breve, o STF decidirá causa envolvendo o Presidente Bolsonaro e a Deputada Federal Natalia Bonavides (MS 36.648). No caso, a Deputada Federal foi bloqueada no Twitter pelo Presidente, em razão de comentários e críticas a diversas postagens de Bolsonaro.
Com o bloqueio, a Deputada não pode mais se expressar na página oficial do Presidente, o que suscita novas questões sobre o exercício da liberdade de expressão no campo onde esse direito é exercido atualmente: redes sociais.
Antes, a liberdade de expressão encontrava-se no espaço público. Hoje, as redes sociais permitem, não só com que cada pessoa expresse a sua opinião política, mas também a visualização dessa opinião por inúmeros usuários, o que propicia debates, a conclamação de reuniões/passeatas/manifestações e, até mesmo, podem desaguar nas eleições de candidatos.
Contudo, as redes sociais, como plataformas privadas empresarias que são, possuem agendas políticas próprias e regras de conduta que são apresentadas ao usuário, o qual deve aceitar, unilateralmente, para que possa se manifestar nas postagens ali veiculadas.
Um crítico voraz do Governo poderia criar uma página própria ou visitar o perfil do governante para expressar o mesmo conteúdo que faria nas ruas ou em artigos de jornal. No entanto, no segundo caso, a página criticada é de uma pessoa natural e a plataforma pertence a uma empresa que visa o lucro e a manutenção de uma relação de confiança com o seu público, a partir de regras de conduta a serem acatadas pelos usuários sem, aparentemente, o Estado atuar como censor do conteúdo proposto.
Se expressões desagradáveis e impactantes podem ser esperadas e suportadas por terceiros em manifestações de rua em nome da liberdade de expressão, como reconheceu Celso de Mello na ADPF (187), não podemos dizer o mesmo de redes sociais que podem “censurar” conteúdos que violem seus termos e condições de uso.
Nos EUA, o Presidente Donald Trump foi impedido pelo judiciário norte-americano de bloquear críticos de seu governo, pois, embora a conta fosse de uma pessoa natural e particular, o governante a utiliza como plataforma para divulgação de feitos oficiais de sua gestão, além de servir como canal de apresentação de propostas governamentais. Portanto, o bloqueio feito por Trump se caracterizaria como um ato de censura baseado em um ponto de vista, uma vez que o ato presidencial afastou apenas aqueles que o criticam do debate público travado em sua conta do Twitter.
Voltando ao caso brasileiro, três pontos precisam ser problematizados em nosso entendimento:
O exercício da liberdade de manifestação e pensamento não se limita aos locais públicos e a intermediação empresarial sempre permeou a propagação da informação e de manifestações políticas, como, por exemplo, editoras de livros e redações jornalísticas.
Limitações à extensão da liberdade de manifestação devem ser esperadas em plataformas mantidas por empresas, tais como restrições à linguagem utilizada (ex: palavras de baixo calão) em decorrência de suas políticas de uso.
O discurso político, como categoria super protegida dentre as diversas formas de manifestação, é capaz de influenciar a mutação da natureza do local onde um agente público hospeda informações sobre sua atuação política. O fato de as informações sobre o governo feitas pelo Presidente no Twitter não se caracterizarem como atos administrativos oficiais não altera o uso político da conta pessoal na rede social. Se o Presidente escolheu, deliberadamente, utilizar sua conta do Twitter para divulgar assuntos de interesse público, deve tolerar as críticas a sua publicação. Faz parte do jogo democrático.
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